segunda-feira, 6 de julho de 2009

Sobre o sobreviver

Se sobreviveres a uma chuva de obuses, abriga-te numa das crateras; eles nunca caem no mesmo sítio. Se sobreviveres à batalha, afasta-te dos cadáveres; a morte traz a doença. E se sobreviveres à guerra, refugia-te no Homem; ele conseguirá a paz. Se tiveres a sorte de sobreviver a estes mundos, terás de descobrir finalmente como sobreviver ao Homem, e como sobreviver à paz.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

A experiência da Imperatriz

Quando um dia a Imperatriz da nossa grande nação decidiu depois de um sonho atribulado fazer organizar uma experiência, ninguém, nem mesmo os conselheiros mais próximos, puderam entender, depois da cuidadosa descrição do despacho imperial, qual poderia ser a razão de tal desejo. Eis as suas palavras: «Que seja escolhido entre os muitos órfãos da nossa nação um criança saudável com poucos dias de vida. Que seja esta criança levada para o palácio imperial, onde terá o direito a uma boa alimentação e a uma educação. Que seja à esta criança, todos os dias sem excepção, simulada a execução de um inocente. A criança não deverá saber que se trata de uma falsa execução. As simulações deverão ser mantidas em segredo.» E assim foi.

Quando a criança, agora adulta, completou os dezanove anos de idade, uma festa foi organizada no jardim do palácio. Para a ocasião mais de mil pessoas foram convidadas. No final do evento, uma execução foi organizada. Apesar das execuções serem consideradas bárbaras e inumanas, ninguém ousara levantar objecções. O jovem aniversariante foi instalado numa cadeira elevada por um pequeno pedestal de onde teria uma vista privilegiada para o evento, e de onde ele próprio seria também facilmente observado por todos os presentes. Terminada a execução, o público, horrorizado pelo terrível espectáculo, descobre ao mesmo tempo, sentado no cimo da sua cadeira, um jovem rapaz completamente indiferente a comer delicadamente o seu bolo de aniversário. Subitamente, por completo espanto de todos os presentes, o executado, supostamente atravessado por dezenas de balas, levanta-se sorrindo para o público. A multidão pensa então perceber ter-se tratado do habitual sarcástico humor negro da magnífica Imperatriz. Ao contrário de todos os outros, o aniversariante fica absolutamente espantado. A Imperatriz observa do cimo da sua varanda as reacção do jovem rapaz. Virando-se para os seus conselheiro, finalmente diz: «Senhores, o nosso povo é bom, justo e inteligente. É nas suas crianças que a barbárie, a injustiça e a estupidez potencialmente residem.» Pouco tempo depois, o jovem rapaz desapareceu.

Consciência da irrecuperabilidade do tempo

A obsessão pelo tempo foi substituída por um mórbido e desobediente desprovimento de vontade. A consciência nervosa, a urgência obcecada e...